A primeira série dos “Cadernos” (1940-42) foi organizada pelos três poetas referidos e engloba cinco números antológicos; a segunda (1951) foi concretizada por Jorge de Sena, Ruy Cinatti, José Blanc de Portugal e José-Augusto França com sete fascículos. A terceira teve três números (1952-53).
Tomaz Kim / Joaquim Monteiro-Grillo
Nascido há cem anos, em 1915, e desaparecido em 1967, foi poeta*, professor da Faculdade de Letras de Lisboa, ensaísta, tradutor. Deu a conhecer ao público português muitos escritores da literatura inglesa e americana.
É justamente recordado este mês no Jornal de Letras num extenso artigo ilustrado com uma fotografia que aqui publiquei em 2009. Foi aliás a fotografia que me conduziu à descoberta do excelente texto de Fernando J. B. Martinho, de que reproduzo este pequeno excerto, a acompanhar uma tradução de Tomaz Kim que encontrei junto de recordações dele que os meus pais guardaram, neste caso uma simples folha de bom papel, bem impressa em frente e verso.
*
Os dois volumes do que consideramos ser a segunda fase da sua obra situam-se num período em que a carreira académica do poeta iniciada em 1947 alcança justíssimo reconhecimento institucional, que a morte precoce, em 24 de Janeiro de 1967, pouco antes de atingir os 52 anos, veio, lamentavelmente, interromper. É este um período em que o poeta, fiel continuador do que há já de uma sólida tradição modernista em termos nacionais e internacionais, faz acompanhar a sua prática poética da tradução de poetas ingleses e americanos (com maior incidência na 2ª metade dos anos 40, no Diário Popular), e de textos de doutrina crítica, de Shelley e T.S. Eliot, e de ampla produção crítica e ensaística própria, que assina com o seu nome civil, Joaquim Monteiro-Grillo ou J. Monteiro-Grillo.
[Fernando J. B. Martinho in "Tomaz Kim Um poeta de tempos dramáticos" - Jornal de Letras, Artes e Ideias, Número 1172 – 2-15 Setembro de 2015]
*
Minster Lovell, de David Wright, tradução de Tomaz Kim
MINSTER LOVELL
Now I a ghost ascend a broken stair
where no more the cold fingers of the rain
comb, or the winds caress my long brown hair;
I move among the populous passages
peopled with brown leaves and the sluggish weed,
and the wind's mutterings and memories
of sere wolds and the dark Atlantic seas.
Remembering now the dancing. O my lover
break down the cold embraces of the grave:
murder the time, recover
the lost words, the lost glances.
Remembering now the dancing. I remember
voice of the harp, the tender
not of the flute, the tremble
of the low-toned clavichord;
the whisper of the dresses
as the dancers turned and parted
as the music paused and started.
The dancers are departed.
Now I a virgin ghost, under the cold
and lunatic moon, forsaken. Whom these walls
already have forgotten. Whom they hold
in the dark rain of spring, in the cascade
of the clear pool that will not wet my feet.
O find me whom I fled
before the leaden pressure of the lid
weighs down the thin white arms and bended head.
Who only hears the voices on the stair
who cannot hear the dry grate of the lock.
I am bound in with darkness. In the iron
strong womb of time. The lover
clasped by a stronger, more enduring arm;
in a more proud embrace.
O find me. Find, recover.
Break down the cold embraces of the grave:
shatter these hasps, and scatter
eternal walls, and batter
with a white leap of light the night. Discover
the bright horizons.
I heard a footstep on an outer stair:
I heard a voice call once, and call my name.
I blinded in the tangle of my hair,
pressed in with darkness. Who will not recapture
the sunlight or the crocus, who will wander
in the moon's error and the winds, forgotten.
Virgin of the spring rains, among these walls.
Now I the ghost of a delighted bride
brought to a dark unrobing, and a bed
celibate, to surrender
a living virginity for a dead;
O this my pride to tender
to the malicious worm my slender head.
Brown hair and white limbs, who will not remember?
I not await him. I await no lover;
who overtakes the still feet of the years?
And I have mouldered in the dust too long,
too long my being in the. darkness fed.
Under the sallow moon I must await,
tenant of hollow winds and bitter rain,
the new birth of the crocus. Non deliver.
And none return. The constellations wheel
westward; and westward the reluctant moon.
None shall burst down the indurate barriers;
none open wide the doors: and none return.
Westward the moon. Inhabitant of the springs,
the short grass and the broken palaces,
I meditate the winds and the cold rain.
DAVID WRIGHT *
MINSTER LOVELL (tradução de TOMAZ KIM)
Ora, eu, um espírito, ascendo a escada carcomida
Onde não mais os álgidos dedos da chuva penteiam,
Ou o vento acaricia, a minha longa cabeleira fulva.
Caminho por entre populosas veredas
Povoadas de folhas secas e erva daninha inerme
E murmúrios do vento
E lembrança
De tantos plainos e sombrios mares atlânticos.
Lembro, agora, a dança... Ó, meu amado!
Desenlaça o gélido abraço da tumba:
Assassina o tempo,
Retoma as palavras perdidas, o perdido olhar...
Lembro, agora, a dança.,.
Lembro a voz da harpa,
O terno trinar da flauta,
O trémulo grave do clavicórdio,
O sussurro das vestes,
enquanto os bailarinos rodopiam e se separam,
Quando a música se detém e recomeça.
Foram-se os bailarinos.
Ora, eu , espírito de uma virgem,
Abandonada sob a lua fria e tonta,
A quem estes muros já esqueceram,
A quem eles retêm na chuva escura da Primavera,
Na cascata da límpida lagoa que não molhará meus pés...
Oh, encontra-me, a mim, de quem eu fugi,
Antes que o plúmbeo peso da tampa
Comprima os alvos braços esguios e a cabeça tombada,
Aquela que ouve apenas as vozes na escada
Aquela que não pode ouvir do ferrolho o áspero arranhar.
Envolta estou em treva
No fero útero férreo do tempo.
O amado,
Enlaçado por um braço mais firme e duradouro
Num mais soberbo abraço.
Oh, encontra-me,a mim. Busca, retoma.
Desenlaça o gélido abraço da tumba,
Despedaça estas ferragens
E dispersa os muros eternos
E desfaz a noite com um alvo arranco de luz.
Descobre os rútilos horizontes ...
Ouvi passos numa escada, lá fora,
Ouvi uma voz a chamar uma vez, a chamar pelo meu nome.
Eu fiquei cega no emaranhado do meu cabelo,
Confundida com a escuridão,
Eu, aquela
Que não virá acolher a luz do sol ou a flor do açafrão,
Aquela que vagueará, esquecida,
Nos enganos da lua e do vento,
Virgem das chuvas da primavera,
Entre estes muros...
Ora, eu, espírito de uma noiva deslumbrada,
Levada a um tenebroso desvelar
E a um leito solitário
Para render
Uma virgindade viva a uma virgindade morta...
Oh, este, o meu orgulho:
Ofertar ao verme malévolo a minha cabeça donairosa!
Cabeleira fulva e alvos membros, Quem os não lembrará?
Não espero por ele. Não espero nenhum amante;
Quem ultrapassará as quietas passadas dos anos?
E eu me desfiz em pó, no pó, há muito, já...
Há muito, já, meu ser das trevas se alimentou.
Hóspede do vento cavo e amarga chuva,
Sob a lívida lua, eu tenho de aguardar
O novo natal da flor de açafrão.
Ninguém o fará.
E ninguém regressará.
As constelações rodam para ocidente
E para ocidente, a lua relutante.
Ninguém derrubará as barreiras firmes,
Ninguém escancarará as portas
E ninguém regressará.
Para ocidente, a lua.
Habitante das fontes,
Da erva núbil e dos palácios em ruínas,
Eu pondero os ventos e a chuva fria!
*
Notas:
Obra Poética de Tomaz Kim aqui
Cadernos de Poesia aqui
Fundada por Tomaz Kim, José Blanc de Portugal e Ruy Cinatti, a revista “Cadernos de Poesia” teve publicação intermitente, em três séries e quinze números, nos anos 1940-42, 1951 e 1952-53, revelando alguns dos poetas portugueses mais marcantes da segunda metade do século XX: além dos fundadores, Jorge de Sena, Sophia de Mello Breyner Andresen e Eugénio de Andrade.
David Wright aqui
Veja também neste blog os posts:
Fatias de família (Alto Alentejo)
Pão 500 gramas
Açúcar 500 gramas
Ovos 4
Pau de canela q.b.
Canela em pó q.b.
Vinho 1/2 decilitro
Corta-se o pão em fatias e aloura-se um pouco no forno. Dispõem-se numa travessa funda e regam-se com o vinho açucarado a ferver e temperado com o pau de canela.
Quando estiverem molezinhas retiram-se as fatias do molho e escorrem-se. Põe-se ao lume, numa caçarola, o resto do açúcar e um pouco de água até ganhar ponto. Depois vão-se mergulhando as fatias nos ovos batidos, uma a uma, e fritando na calda do açúcar. Estando todas cozinhadas, regam-se com o resto da calda e polvilham-se com canela.
M.A.M. [pseud. colectivo de Maria Adelina Monteiro Grillo e Margarida Futscher Pereira]
in Cozinha do mundo português. Porto: Livr. Tavares Martins, 1962, p. 633
As 1001 receitas deste livro foram coligidas e experimentadas ao longo de muitos anos por Maria Adelina e Joaquim Monteiro Grillo — o poeta Tomaz Kim — e meus pais, Margarida e Vasco Futscher Pereira. A edição, em 1962, deveu-se a Maria Adelina — Nita Monteiro Grillo — cuja dedicação ao projecto o levou a bom porto.
É recordado como o melhor livro de Cozinha Portuguesa no blog Prosimetron aqui e aqui.
O cineasta António-Pedro Vasconcelos, que tinha 35 anos há 35 anos, recorda os tempos em que era difícil ser jovem num País vigiado e em que nem se podia beijar a namorada em público, mas onde também era impossível ser um velho intelectual activo e respeitado num regime que perseguia inteligência e liberdade.
Não é fácil explicar a um jovem de hoje - que julgará que o querem gozar quando se conta que a primeira televisão do realizador foi comprada a prestações para ver um jogo internacional do Benfica ou que chegou a pôr no "prego" (essa instituição antiga, onde se deixavam objectos, fosse a máquina de escrever ou o par de sapatos, como garantia do dinheiro emprestado) a aliança de casamento e o esquentador da casa de banho - o que era ter 21 anos no Portugal das décadas de 50 e de 60.
Só a partir de 1966/67 é que começa a surgir um maior consumo (televisão, semáforos, novos cafés) e, naturalmente, o boom da publicidade, que deu emprego a muita gente, dos escritores (O'Neill, Sttau Monteiro, Alves Redol, Ary dos Santos) aos cineastas (Fernando Lopes, José Fonseca e Costa e António-Pedro Vasconcelos, que filmou uma centena de anúncios).
O pior era, contudo, esse "ambiente de Feira Cabisbaixa, como tão bem definiu [no livro de poemas] o Alexandre O'Neill". Expulso de um café por beijar a namorada ou a conversar olhando sempre para a mesa do lado e tentando perceber se havia algum informador da PIDE a ouvir o que se dizia, com uma censura que só deixava projectar “Os Quatrocentos Golpes” depois de fazer 14 cortes no filme de Truffaut, ao sair dessa Lisboa provinciana, fechada e vigiada para Paris da liberdade e da vivacidade o choque era enorme.
Um jovem português de hoje, além de não sentir a vergonha ("era quase humilhante, a não ser que se tivesse, como cartão de visita, o estatuto de exilado, desertor, resistente") de ser identificado com o País da ditadura e da guerra colonial - o que era inevitável até 1966, "quando tudo mudou por causa do Eusébio no Mundial de Inglaterra" -, também não sente o mesmo contraste entre Portugal e o resto da Europa.
"Assediado para entrar no PCP, como toda a gente da minha geração (até porque os comunistas dominavam o Cineclube Universitário e a revista Imagem), apesar de ter ideais revolucionários, não aderi (nem nenhum dos meus amigos da época) porque li, quando era muito novo, um livro sobre os Processos de Moscovo e fiquei a saber o que era o estalinismo."
No fundo, a forma do seu grupo de amigos se manifestar era, por exemplo, distribuírem-se por uma sala onde era projectado um filme português daquela época e começar a patear - como fizeram no Éden, a 6 de Maio de 1960, na estreia de “O Cantor e a Bailarina”, de Armando de Miranda, acabando todos na esquadra.
"Um lado tenebroso do regime é que os intelectuais ou se exilavam, como o Jorge de Sena, ou então desistiam, morriam por dentro".
Um dos primeiros contemplados com os subsídios da Gulbenkian, em 1971 rodou Perdido por Cem, em torno de Artur, um rapaz da província (interpretado por José Cunha) que aproveita uma boleia de Rui (papel confiado a José Nuno Martins) para se escapar para Lisboa. Numa das cenas, filmada em directo na Pastelaria Suíça, no Rossio, o protagonista "lia Musil e olhava para as pessoas que por ali estavam, quase só homens, todos de chapéu, vestidos de negro, cinzento ou azul escuro, com um aspecto taciturno, como se fosse a Feira Cabisbaixa do O'Neill".
Fernando Madaíl
in "Diário de Notícias", 25 de Abril de 2009, na íntegra aqui
Cartaz do filme Perdido por Cem
de António Pedro Vasconcelos (Portugal 1972).
um post recente sobre António Pedro Vasconcelos e a sua obra aqui
Devagar, sem pudor nem malícia,
Peça a peça tombando a teus pés,
Bem-me-quer, bem-me-quer,
Bem-me-quer, nua e breve,
Um momento, na penumbra,
Como traço de farol
No leito,
Riscando o lençol.
Cerradas as portas de dentro,
Fica uma réstea amarfanhada de Sol
No lençol.
Serão, depois, as palavras ciciadas serenas
E uma lágrima, talvez... que se não vê
E um brilho nos olhos ainda longe.
Revolto o cabelo,
A cabeça no braço apoiada, tão leve...
Perdura um arfar na tarde finda,
A colcha enrodilhada no soalho.
Ciciadas, a medo, as palavras,
Não se desfez o nó que se quis cego,
O frémito e a sofreguidão.
De silêncio a penumbra:
Lá fora, na calçada quieta,
O rodar de um carro, silêncio depois,
Regressam braços a enlear:
Morfina o tempo retendo
No clarão 'inda alvo do lençol,
Extinta, embora, a réstea de Sol.
Tomaz Kim
in Exercícios Temporais
Colecção Poesia e Verdade, Guimarães Editores,1966.
a obra de T.K. aqui
Carreço, c. 1950
Ruy Cinatti foi um dos amigos mais queridos de minha mãe, e queria dedicar-lhe um post, a seguir aos Monteiro Grilo, e ilustrá-lo com esta fotografia. No entanto, ao procurar documentos sobre Cinatti numa pasta, encontrei a carta que a seguir transcrevo, e me faz regressar a Ruben A.. A fotografia pertence à fotobiografia "O Mundo de Ruben A." (Assírio e Alvim).
Coimbra a dos poetas 5-N-42
Caro Vasco,
É com um prazer enorme que te escrevo estas linhas pois além de me fazerem lembrar de ti, um bom e franco amigo me leva a recordar a tua simpática comparência ao nosso castiço jantar. Foste de facto um bom amigo – “a real friend”.
Feita esta introdução académica e pompadouresca mas sincera no seu realismo e surrealismo, vamos contar-te o que este menino vindo de Lisboa viu e ouviu. Excedeu em tudo não poderei dizer, mas em quási tudo a minha expectativa, esta Musa do Mondego. Tirando duas ou mais cenas cómicas duma graça infinita que me aconteceram à chegada e no dia seguinte, tudo se tem passado num ambiente clássico e de bom gosto. Uma das cenas de que fui protagonista é esplêndida e por isso te conto. Ei-la: como sabes não conhecia nada de Coimbra, cheguei de noite com a etiqueta ao pescoço, que dizia Rua de Sta Teresa 33. Cheguei a casa. Comi e dormi como todo o mortal, (lá alguns mortais, coitados negam a utilidade dum bom bife e dum carrascão) Deixá-los viver.
Aqui começa propriamente a cena. Segunda-feira de manhã, oito e meia depois de perguntar à criada mais ou menos o caminho para a Faculdade, ou melhor a Universidade, saio de casa e dirijo-me a passos largos pelo tal caminho. Chego a um sítio lindo ao pé dos Arcos e do Jardim Botânico e indeciso fiquei com respeito ao rumo a tomar. Olhei as plantas mas não me senti botânico, vi um eléctrico que dizia Calhabé e pensei que iria para a cidade dos rapazes pois o nome é próprio para ser adorado pelos “enfants terribles”. Nisto aparecem três tipos em capa e batina e outro com uma pasta, fiquei radiante, já não poderia fazer figura fraca perguntando o caminho para a Universidade. Foi a Universidade que fez a cidade! (Não lhes perguntei nada) Segui-os a passo rápido, andei, andei já um pouco desconfiado quando de repente os “bichos” (nome dado aqui aos alunos do liceu) param e entram para um jardim, então eu leio na casa, escrito em grandes letras: Colégio Luiz de Camões, Externato e internato — Ambos os sexos!!!!!
Eis caríssimo Vasco o que foi o meu primeiro contacto com isto tudo. Ri,ri e tornei a rir. A minha chegada a Coimbra como vês foi brilhante e cómica. Conto-te algumas coisas que se passam na Liberalium Artium Facultas e que tu companheiro de louros nessas coisas deves apreciar. Tenho professores esplêndidos. Damião Peres a H. Dos Descobrimentos que ultrapassou tudo o que pensava a seu respeito.
Maximino Correia a Psicologia Geral, com muito sistema nervoso e localizações mas falando de Bergson, Freud e escolas modernas. Não me posso ainda pronunciar a seu respeito. H-F-Moderna (teóricas) Joaquim de Carvalho que fez duas aulas de introdução ao estudo da F. Moderna e a alguns aspectos da Renascença, falando e dominando o assunto com uma claridade imensa. (Práticas) Magalhães Vilhena, ainda não tive aulas com ele mas já lhe falei, andou-me a apresentar a todos os tipos dos institutos estrangeiros. Foi simpático.
H. Moderna tenho um Dr. Brandão, ainda só houve apresentação ??? Arqueologia tive hoje a primeira aula é o Orlando Ribeiro, já sabes a classe dele.
H.F. Portugal (2º semestre) Joaquim de Carvalho. Numismática (2º semestre) Damião Peres.
Eis um resumo completo da minha actividade escolar em que tenho uns colegas que só se interessam por futebol e animatógrafo. A mentalidade e o interesse cultural aqui é baixíssimo. Espero sem ser vaidade que isto seja óptimo para mim. Tirando os tipos do Novo Cancioneiro que são excelentes de resto a Academia aqui não tem interesse nenhum.
Os teus exames? A Margarida e sua morada? Tu naturalmente com muito amor. Enfim tenho de acabar a carta pois graças a Deus tenho mais amigos a quem escrever. Espero em Deus que passes e venças sempre pois este é o meu maior desejo. Aguardo carta tua com grande ansiedade recebe muitos abraços e dá cumprimentos a tua família.
Teu sempre amigo e futuro padrinho,
Ruben
Carta de Ruben para Vasco
Poemas de Ruy Cinatti aqui
Mais neste blog sobre Ruben A. e Cinatti aqui e sobre os estudos do meu pai em Coimbra aqui
Legação da União da África do Sul
Lisboa, 31-5-1950
No sentido dos ponteiros do relógio:
Maria Adelina (Nita) Monteiro Grillo, Mª Helena Amaral Trigueiros, Joaquim Monteiro Grillo, Luís Forjaz Trigueiros, Mrs Pohl Ministra da União Sul-Africana, Carvalho Nunes, Vasco e Margarida Futscher Pereira.
Em 1950 o meu pai estava de partida para Rabat, o primeiro posto que ocupou na carreira diplomática, embora já tivessem vivido em Roma, onde nascera a minha irmã Cristina, em 1948.
Maria Adelina e Joaquim Monteiro Grillo - o poeta Tomaz Kim – eram amigos dos meus pais desde a faculdade. Luís Forjaz Trigueiros era Director do “Diário Popular”, jornal em que a minha mãe publicou diversos artigos.
Mais sobre Tomaz Kim aqui e Luís Forjaz Trigueiros aqui
Joaquim Monteiro Grillo, Vasco, Cristina e Christine Marshall
Parque de Yosemite, California, 1961
TEMPO DA MEMÓRIA
Memória dúbia,
Assim te aceito
Antecipando o futuro ou já.
Tua raiz é liame inevitável
E madre nossa corrupta,
Parceira da razão parda.
Memória impertinente
És,
Nas montras, monstro familiar
E nos cafés e nos livros,
Ao lado do volante,
Nos vultos, nos gestos, carícias, até...
A sua sombra.
E no resto,
Estrume em requintado canteiro
De poesia ou versos só,
Mas queira Deus, flores também,
Mesmo proibidas de colher...
Tomaz Kim
in Exercícios Temporais
colecção Poesia e Verdade, Guimarães Editores,1966.