cuecas de Marks & Spencer
O Macho da espécie
O homem, isto é, o macho da espécie, sejam quais forem a côr da sua pele, o desenho dos seus olhos, a sua estatura grande, meã ou pequena, as suas inclinações metafísicas e religiosas – judias, cristãs, mussulmanas, de outros monoteísmos, dos incontáveis animismos que vigoram até em recantos esquecidos do Planeta, alguns tão pequenos que quando alguém mais morrer acabou uma outra eternidade, de afirmações de ateísmo tenazes mesmo neste tempo em que tantos de nós cling to their guns and to their Gods, na expressão feliz do então presidente Barack Obama (ao falar em privado de brancos pobres americanos mas estava lá microfone que não fôra desligado e a privança acabou-se) -, sejam quais forem também as suas preferências sexuais, o seu feitio bom ou mau, é sempre ser inseguro de si, desconfiado de que outros machos da espécie, piores mas mais astutos do que ele, o queiram fazer passar por parvo ou pior ainda, susceptível como primadona e bruto como arruaceiro de claque clubista, convencido contra abundância de evidência que a ele serve também, como fato feito por medida pelo falecido Mendonça da extinta Piccadilly ou em Saville Row, o nome que Isabel a Católica deu ao nosso Rei D. João Segundo: El Hombre.
Mas talvez eu esteja a exagerar. Antes de escrever o parágrafo acima tinha-me lembrado do Marks & Spencer de quando eu chegara a Londres há quase meio século (já Marks fora nobilitado e tomara nos Lords partido pelos trabalhistas), comerciantes sábios que fidelizavam a clientela e na secção de roupas de homem tinham cuecas de três tamanhos. Em ordem decrescente: Large, Medium e Average. Small não havia – e nessa altura não ocorreu a ninguém processar a companhia por descriminação; nem nessa altura nem desde essa altura, com tantas feministas à solta que por aí há. Em 1963, o Império já fora abandonado e muita gente vinda dele e de alhures pegava-se a Londres como moscas a papel para apanhar moscas mas de outras partes do mundo vinha muito menos gente do que agora. Nesse tempo, por exemplo, quase ninguém conseguia saír da U.R.S.S. e dos países do Leste da Europa; por toda a parte, excepto em bizarrias folclóricas tais como o País Basco espanhol e a Irlanda do Norte, a Guerra Fria impedia ou matava no berço zaragatas menores de vizinhos ou fanáticos, evitando assim, inter alia, as múltiplas e desgraçadas migrações a que assistimos agora, algumas das quais transformaram o Mediterrâneo num cemitério marinho, desta vez verdadeiro. Londres tem gente de muitos lugares mas talvez não de todos os conhecidos e, por isso, a minha generalização foi indevida: em vez de ‘sempre’ eu deveria ter dito ‘se for cliente ou potencial cliente das lojas Marks & Spencer de Londres’.
De resto, para lá do caso presente, a mania das generalizações ou, como dizia Wittgenstein em inglês, sua língua profissional, ‘the craving for generalizations’, faz muito mal ao hábito de pensar, criando problemas onde não os haveria e erros escusados.