Quarta-feira, 13 de Junho de 2018

O Bloco-Notas de José Cutileiro

Mon. Grande Guerra-

Monumento aos mortos da Grande Guerra em Lisboa

 

 

José Cutileiro

 

 

A caminho dos anos 40

 

 

                                        (…) isto lembra cada vez mais a transição dos 20 para os 30. Ainda há pouco tal pareceria impensável mas agora esperemos que não dê nos 40, escreveu-me o Fernando que esteve em muitos lugares, conheceu muita gente e tem a cabeça mais bem organizada que conheço fora do mundo académico (dentro tampouco há muitas capazes de lhe pedir meças). Não posso estar mais de acordo com ele.

 

Cada dia acrescenta sinais percursores. Por exemplo: governo austríaco, coligando direita dirigida por primeiro-ministro de 31 anos e extrema-direita mais idosa, fechou algumas mesquitas e expulsou imanes turcos. Por ter dado muito mais guardas de campos de concentração nazis per capitado que a própria Alemanha, a Áustria lembra-me o proverbial canário da mina (posto lá porque anidrido carbónico mata primeiro um canário do que um homem, dando tempo a este de fugir se houver fuga de gás).

 

Preocupante também, de outra maneira: nos Estados Unidos, 87% dos membros do Partido Republicano – homens e mulheres – aprovam sem reservas o desempenho do Presidente Trump. Na realidade, o partido deveria ter passado a chamar-se Partido de Trump. O Partido Republicano a que estávamos habituados, o de Abraham Lincoln, Theodore Roosevelt, Ronald Reagan, foi de férias não se sabe para onde nem se algum dia voltará (ou pelo menos assim disse há dias John Boehner, um dos seus mais activos dirigentes nos tempos de Obama e Bush).

 

Trump fez campanha sem disfarçar quem era: mentiu a torto e a direito, recusou-se a revelar rendimentos, foi machista, racista, brutal e ordinário, insultou aleijados e inválidos de guerra, heróis ou não, exibiu ignorância, incompetência, xenofobia e desprezo por minorias e elites, tudo espetacularmente e ganhando a pouco e pouco cada vez mais adeptos. No voto popular ficou três milhões atrás de Hillary, mas em três Estados chave onde brancos pobres tinham votado Obama em 2008 e 2012 (e, portanto, derrotado Hillary nas primárias para 2008) desta vez votaram Trump, deram-lhe a eleição e acreditam nele como num salvador. Com oportunismo e curteza de vistas tradicionais, congressistas e senadores do partido por um lado, e homens de negócios por outro, atentos à voz do povo, decidiram pôr-se também do lado de Trump. Cálculo comparável mutatis mutandis ao de alguns apoiantes táticos do começo de Hitler (como o político Von Papen, absolvido em Nuremberg ou o industrial Krupp, condenado a dez anos) convencidos de que o domesticariam.

 

A época, o lugar, as pessoas são outras mas o que mudou foi que agora vai tudo mais depressa. O comunismo que ajudou a derrotar o fascismo era remédio falso – como remédio falso fora o fascismo – e a doença está assanhada outra vez. Por toda a parte há ricos, poucos, cada vez mais ricos e pobres, muitos, cada vez mais pobres. Não dá.

 

Coitado do meu neto? Talvez mas, vendo mais longe, talvez bisneto venha a festejar vitórias da Democracia e quedas de outros Muros de Berlim.

 

 

 

publicado por VF às 09:00
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