Recolher, preservar e divulgar as memórias de gente comum, reconhecendo que esses testemunhos de vida contribuem para o conhecimento da história e da identidade nacionais, é a missão do Arquivo dos Diários, associação cultural criada há dois anos, que lançou o concurso “Conta-nos e Conta Connosco”, destinado a enriquecer o seu acervo.
Agora que dispõe de uma equipa e de um espaço na Biblioteca de São Lázaro, graças a uma parceria com a Junta de Freguesia de Arroios, a associação está em condições de começar a reunir cartas e diários através dos quais os portugueses poderão contar a sua história. Diários, cartas, fotografias e filmes caseiros ou simples evocações feitas pelas pessoas são uma parte importante na construção da memória de cada um. Mas esses documentos servem também para ajudar a construir a narrativa de uma comunidade. A ideia é catalogar por temas tudo o que for recebido e, no futuro, disponibilizar o acervo num meio digital.
Existem já em vários países europeus arquivos dedicados a recolher a memória popular, designadamente o Archivio Diarístico Nazionale, em Itália, que serviu de referência a Clara Barbacini e Roberto Falanga, fundadores deste projecto.
© Soraia Martins
O principal obstáculo, admitem, é chegar às pessoas e mostrar-lhes que as suas memórias e objectos pessoais podem ajudar a desenvolver outros projectos interessantes, do cinema ao teatro, da ficção à investigação, ou simplesmente servir para consulta de quem tem curiosidade por histórias de outros tempos.
“Espero que os portugueses desmintam o pudor como traço da sua cultura”, diz Roberto. “Sei que vai ser complicado, mas desafiante. E acho que só o facto de alguém se questionar se deve ou não entregar [os diários e cartas da sua família] já é bom. Estimula o pensamento. Nesse tempo de reflexão o tema esteve ali, a ser considerado.”
Também sabem que poderá haver resistências à entrega de materiais e à publicação. “Sabemos que estamos a tocar assuntos muito delicados”, asseguram. Recordam o caso de uma mulher, vítima de violência doméstica, que ganhou em Itália um concurso semelhante ao agora lançado em Portugal e só anos mais tarde recebeu o prémio, depois de o marido morrer. Há também questões legais que podem colocar-se, por exemplo, no caso de pessoas que encontram ou compram materiais que não se importam de doar mas que dizem respeito a terceiros.
Tal como em Itália, está prevista a publicação anual de pelo menos um diário: quem entrega os seus materiais pode escolher participar num concurso aberto até 1 de Março próximo. Depois, um painel de dois júris – um popular e um técnico – escolherá um vencedor. Será publicado pela Penguin – Companhia das Letras.
As entregas podem ser feitas na Biblioteca de São Lázaro todos os sábados das 11h às 13h ou enviadas por correio e a associação tem um site com toda a informação em www.arquivodosdiarios.pt. Tem também uma página de Facebook aqui.
Arquivo dos Diários
Biblioteca de São Lázaro
Rua do Saco, 1 Lisboa 1169-107 (Freguesia de Arroios)
Agradecimentos:
artigo de Vanessa Rato no jornal Público, artigo de Samuel Alemão em “O Corvo” e textos reunidos no site Arquivo dos Diários.
Fotos gentilmente cedidas por Arquivo dos Diários e Soraia Martins
Garrett - Columbano (detalhe)
Carta de Almeida Garrett ao político e amigo Rodrigo da Fonseca Magalhães
"Pensa", escreve Garrett em 1846 ou 1847 ao seu amigo, nesta carta inédita que pertence à Biblioteca Nacional. "E se julgares que podemos com um acordo perfeito, íntimo, mas secreto, fazer algum bem a esta pobre terra, avisa das horas mais convenientes de te ver." Estava-se em plena Guerra da Patuleia, que dividiu o país entre liberalistas e miguelistas, e Garrett oferece-se para ajudar. O "acordo", se existiu, manteve-se mesmo secreto. Não se sabe qual foi — se algum — o envolvimento de Garrett nos bastidores.
5a feira
[...]
Meu Rodrigo, aproveito esta ocasião para te pedir que estejas bem em guarda para te não deixares comprometer com certos sujeitos que nós sabemos. Olha que eles nada te podem dar, e se te pudessem dar alguma coisa, não ta davam. Se se chegam para ti é porque sabem que nada têm, e fazem de vampiros para viver do teu sangue. E depois uma de duas, ou te hás-de desfazer deles, e chamam-te traidor, ou os aturas e alienas de ti os verdadeiros valores. No meio destas ruínas em que está Portugal tu podes ter uma bela missão.
Isto é como o terramoto de 55: nós não o fizemos, tu não o fizeste. E o que se incarregar de levantar a cidade caída não é responsável pelo que a deitou abaixo. Esta opinião e modo de ver não é meu, é de muita gente, e poderemos fazê-lo ser do maior número se se for com tento e firmeza.
Tu bem sabes que eu não costumo oferecer-me para nada; mas também sabes que sou amigo verdadeiro e eficaz quando a consciência da razão e da alma se juntam às minhas simpatias pessoais. Eu digo a todos que não sou de políticas, e que abdiquei, mas a ti digo-te que escolhi de propósito e de longamão esta posição insuspeita porque vi do princípio que por bastante tempo outra era impossível com proveito público. Creio que me não inganei. Assim vejo todos, e com todos falo em negócios que de outro modo não são tratáveis.
Se vires que podemos falar sério e com proveito nestas coisas, e que convém, dize e falaremos. Os patuleus estão com mais senso do que os eu supunha.
Se se tenta alguma coisa, é preciso tentá-lo já, isto é, prepará-lo; e parece-me a mim que posso ajudar-te nalguma coisa, especialmente porque cuidam que o não pretendo.
Ora eu realmente para mim aqui nada quero.
Adeus. Pensa, e se julgares que podemos com um acordo perfeito, íntimo, mas secreto, fazer algum bem a esta pobre terra, avisa das horas mais convenientes de te ver. E tu bem deves saber que eu não sou poeta em prosa, e que todos valem mais que eu, menos em lealdade e certeza que ninguém mais que eu vale. Teu dedicado amigo
JBAG
*
A 4 de Março de 1852, ao apresentar o texto do primeiro Acto Adicional à Carta Constitucional, por si redigido, Almeida Garrett proferiu o último discurso na Câmara dos Deputados. Este é um verdadeiro testamento político (a que deve juntar-se a alocução, também derradeira, na Câmara dos Pares, em 10 de Fevereiro de 1854), e nele se inclui este enigma de decifração de profundas convicções:
Eu também já perdi as minhas ilusões; também já não creio na maior parte das cousas em que acreditava; mas há uma única crença, é a crença na minha Pátria é na liberdade dela [...]. Mas quando a perdesse, sumia-a no fundo de minha alma para que ma não suspeitasse a Nação Portuguesa.
Das bancadas parlamentares que o aplaudiram (no registo dos taquígrafos, emotiva e efusivamente o fizeram), não podem contar-se aqueles que terão penetrado o sentido dissimulador, tão do agrado do escritor, que essas palavras contêm.
Ora, descrente das soluções e dos oportunismos que enchem páginas na história do nosso liberalismo, Garrett aprendeu a dissimular as mais fundas crenças, cobrindo-as sob um manto (ou jogo) irónico de "ilusões" e "crenças" com que manteve incólume uma postura de independência dos partidos e interesses particulares de então. Daí a fórmula, que não deixa de ser perturbadora e que podemos traduzir deste outro modo: se hoje deixei de pensar o que ontem posso ter pensado, não afirmo nem desminto tanto o que ontem posso ter pensado como, hoje, o ter deixado de pensá-lo.
Fórmula especiosa... e perturbadora! Afinal de contas, fórmula geral de uma "intimidade constrangida", que, com o tempo (sobretudo, por força de um tempo histórico vivido), aprendeu a escamotear em público as convicções mais íntimas, sem as apagar de todo. Mas quais terão sido estas?
Creio que, de um juvenil ponto de partida republicano (de que o federalismo norte-americano foi "a pedra filosofal" dos sistemas políticos) e jacobino (de que as revoluções servem para "colocar os homens no seu lugar"), permaneceu uma dissimulada posição de defesa do que, no primeiro liberalismo português, podemos considerar os difusos interesses populares.
E, de forma irruptiva e mais ou menos velada, conforme as circunstâncias — nessa "posição insuspeita" de quem já vira "que por bastante tempo outra era impossível com proveito público" (ver carta inédita junto) — , Garrett surgiu nos picos de maior radicalidade ao lado do partido popular e contra o oportunismo das facções.
No geral, manteve o princípio de conservação das liberdades e de estabilidade política que se não confunde com conservadorismo e não pode esconder as crenças subtilmente veladas pelas "endiabradas políticas" que "tudo absorve[ra]m" no nosso longo século XIX.
Luís Augusto Costa Dias
in Jornal Público, Caderno "150 anos da morte de Almeida Garrett ", 9 de Dezembro 2004
* Imagem: Óleo sobre tela de Columbano Bordalo Pinheiro concluido em 1926 [pormenor] . Passos Perdidos, Assembleia da República, Lisboa
Cristina de Carvalho Futscher Pereira
17 de Abril 1948 - 27 de Setembro 2005
O Ramo de Oiro
Estando eu à minha porta
Com três horas de serão
Vi passar Nossa Senhora
Com um ramo de oiro na mão.
Eu pedi-lhe uma folhinha
Ela disse-me que não;
Pedi, tornei-lhe a pedir,
Ela deu-me o seu cordão,
Que me dava sete voltas
À roda do coração.
Sete voltas não são nada
Ó Virgem da Conceição
Prendei vós esta alma toda
Prendei-ma com vossa mão
Que a metade inda é do mundo
Metade, que a outra não.
Plantai-me esse ramo de oiro
No meio do coração
Ficarei no vosso altar
Como vaso de eleição.
Romance popular incluído nos manuscritos garrettianos descobertos pela Cristina em 2004. O poema foi lido no seu funeral e editado numa pagela oferecida aos amigos.
*
Veja também os posts:
Romanceiro
Manuscrito do Autor
[autógrafo de Almeida Garrett]
A compra pelo Estado Português do espólio garrettiano designado por “Colecção Futscher Pereira” [1], anunciada pelo Secretário de Estado da Cultura no dia 18 de Dezembro, fecha um ciclo iniciado há dez anos pela descoberta, por minha irmã Cristina Futscher Pereira (1948-2005), de manuscritos inéditos de Almeida Garrett que contribuem de forma decisiva para o estudo do Romanceiro português.
Fica deste modo assegurada a ampla divulgação deste espólio, o maior desejo de Cristina, além da permanência dos autógrafos em Portugal, nas melhores condições [2]. Por fim, e também importante, com esta aquisição a Direcção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas valoriza aos olhos do público a recolha pioneira de Garrett de temas da nossa tradição oral. São relatos de eventos históricos e histórias de amor, transgressão e violência, de grande suspense e final incerto, que mantêm plena actualidade no século XXI.
Para a família, a colecção permanecerá ligada à memória de Cristina, de Venâncio Augusto Deslandes e de iniciativas e amizades inspiradas pelo Autor [3]. Entregamos estes papéis com muita satisfação e um bocadinho de nostalgia.
*
Notas:
1. A Colecção engloba mais de 400 páginas manuscritas, parte delas inéditas, compreendidas no período de 1839 a 1853/54.
Artigo de Luís Miguel Queirós no Público sobre a aquisição da colecção pelo Estado Português.
2. “O espólio agora adquirido será objecto de um contrato de depósito na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, enriquecendo, desta forma, o já importante espólio garrettiano de que [a instituição] dispõe”, de acordo com o comunicado divulgado pelo Gabinete do Secretário de Estado da Cultura citado pela Agência Lusa.
Espólio Garrettiano da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra [Youtube]
3.
- Blog garrettiano O Divino , 2004-2005
- A Moira Encantada de João Baptista de Almeida Garrett
Edição oferecida pelo "Diário de Notícias" aos leitores no 140º aniversário do jornal, a 29 de Dezembro de 2004
ISSN 0870-1954 Lisboa, Dezembro 2004
- No aniversário da morte de Garrett. Apresentação de um inédito do Romanceiro [Ermitão]
Ofélia Paiva Monteiro e Maria Helena Santana.
Annualia Verbo. Temas, Factos, Figuras, 2005/2006.
- As Fontes do Romanceiro de Almeida Garrett. Uma Proposta de ‘Edição Crítica’ [Tese de Doutoramento em Línguas, Literaturas e Culturas, Especialidade de Estudos Literários]
Sandra Boto
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, 2011
Sobre a Colecção Futscher Pereira e Venâncio Augusto Deslandes leia também aqui
Cerimónia de assinatura do Auto de Depósito de uma coleção de documentos autógrafos de Almeida Garrett
Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra
A descoberta de inéditos do Romanceiro de Almeida Garrett foi anunciada a 7 de Dezembro de 2004 pelo Diário de Notícias [1]. No dia 9 de Dezembro do mesmo ano, integrado num caderno dedicado ao Autor por ocasião dos 150 anos da sua morte, saiu no Público [2] o romance popular “Fonte da Cruz”.
autógrafo de Almeida Garrett
As primeiras e últimas coplas deste romance são uma das mais antigas reminiscências de minha infância. Estou daqui vendo ainda o grupo de crianças que nos sentávamos no chão para o ouvir contar a uma certa pequena pouco mais velha que nós, filha de uma boa mulher que fora ama de leite de minha mãe. Isto é dizer que eu teria quatro anos, os mais velhos de entre nós seis ou sete, e a nossa cantora os seus oito ou nove anos. Era uma santa gente que morava para o Bom Jardim, no Porto, e vivia de pequeno mas honesto tráfico, protegidos por meus pais. A filha ia passar oito ou quinze dias no “Castelo”, pequena quinta nossa, situada daquém Douro. E era um dia de alegria o em que ela chegava, era choro que não acabava quando se partia. Porque ela sabia, além destes cantares ao divino, todas as xácaras da Silvana, da Bela Infanta, e mil outras histórias em prosa e verso, como as da «Maria Cortiço», da «Maria Sabida» do «Rei dos Ratos», «Gata Borralheira», «Rei Ramiro» além de infinitas aventuras de bruxos, lobisomens, moiras incantadas [3] , duendes, etc, cujos títulos individuais me não lembram; era um romanceiro vivo, uma segunda e mais completa edição daquela erudita e copiosa Brígida velha que, em outros lugares de minhas escrevinhaduras, tenho celebrado e citado.
Estas primeiras e últimas coplas eram as que só me lembravam quando a nossa lavadeira, que é uma boa mulher de Loures, aqui veio hoje, 15 de Abril de 1843, e a ouvi cantando a trova na cozinha donde a chamei e, sem grande dificuldade — coisa rara ! — pude obter que ma deixasse copiar, o que fielmente fiz, emendando apenas algum verso demasiado esticado ou curto demais: que poucos foram.
Deixa-me ir à fonte nova
Que nasceu ao pé da Cruz:
É o sangue do cordeiro
Que se chama o bom Jesus.
Um cego, que abriu a fonte
O cego já achou luz,
Que lhe deu água nos olhos
Da fonte da vera Cruz.
Fonte nova, fonte santa,
Fonte de amor que reluz!
Santa Maria ao pé dela,
San’ João com seu capuz.
Outra fonte fazem ambos
A chorar o seu Jesus.
—“ Minha mãe, esse é teu filho”
Diz o Salvador da Cruz,
“João, essa é tua mãe,
Que assim o quero e dispus
À hora da minha morte;
E cá vos fique esta luz:
Que o meu amor não tem fim,
E que entre vós dois o pus
Para se lavar o mundo
Na fonte da vera Cruz.”
Quem quer vir à fonte nova
Que se fez ao pé da Cruz?
É o sangue do cordeiro
Que se chama o bom Jesus.
Almeida Garrett
in manuscritos do Romanceiro garrettiano inédito
Colecção Futscher Pereira
Notas
1. Almeida Garrett foi «o primeiro compilador do nosso Romanceiro, ou seja, de narrativas diversificadas, de vária índole, da nossa tradição oral popular, destinadas a serem meio recitadas, meio cantadas» explica a investigadora Ofélia Paiva Monteiro. O autor terá dedicado grande parte da sua vida a esta recolha. «Entre 1843 e 1851, Garrett editou os três tomos do "seu" Romanceiro, dizendo na Introdução do segundo que a sua colecção viria a ser constituída por cinco livros», lembra esta professora. Mas o elenco publicado só corresponde aos livros I e II. «Os manuscritos agora achados parecem comportar o material compilado para os tomos que não chegaram a vir a lume; e complementam material que já tinha sido dado a conhecer por um Cancioneiro, autógrafo garrettiano (que traz a indicação de ter sido começado em 1824)».
Diário de Notícias, 7 Dezembro 2004
2. "Fonte da Cruz", um poema recitado por uma lavadeira saloia de Loures, foi descoberto em Março [2004] pela família Futscher Pereira num espólio herdado, e mantém-se inédito. Este poema (também chamado "romance" ou "cancioneiro") da tradição oral popular tem origem medieval e Almeida Garrett reuniu-o no Livro III das "Lendas e Profecias", todo ele inédito. Começa com uma introdução, do próprio Garrett.
3. Na transcrição dos manuscritos para o Público, desdobraram-se abreviaturas e pontuou-se raramente para compreensão dos textos, mantendo embora a redacção de palavras peculiares na ortografia garrettiana (como "incarregar" ou "incantadas". [Luís Augusto Costa Dias]
4. Sobre a divulgação dos manuscritos achados em 2004 leia também neste blog o post Long Live Garrett
Fernando Lopes Graça, Horta, Açores 1983
Cumpriu-se faz agora dois anos a primeira etapa do projecto ambicioso dum grupo de amigos de Fernando Lopes Graça (1906-1994): trazer a público uma colecção de peças para piano que o compositor dedicou a amigos e eventos – as “Músicas Festivas” – e registá-la em múltiplos suportes, permitindo a criação de conteúdo não efémero.
Das 23 peças, 13 nunca tinham sido tocadas em público e 18 nunca tinham sido gravadas. A colecção inédita foi apresentada a 16 de Dezembro de 2012 num concerto do pianista António Rosado no Centro Cultural de Belém. Na mesma data saíram os CD "Músicas Festivas de Fernando Lopes Graça", os quatro volumes das partituras (em suporte papel) e foram criados um sítio Web multilingue* e um álbum de fotografias e documentos no facebook.
Um duplo DVD agora lançado [o concerto no CCB, com introdução do musicólogo Rui Vieira Nery, e o documentário "Uma visita aos afectos do compositor"] completa este projecto multimédia, a vários títulos exemplar, constituído por cinco iniciativas produzidas e financiadas por um grupo muito pequeno de pessoas com apoios quase nulos.
O documentário "Uma visita aos afectos do compositor" — retrato intimista e muito cativante de Lopes Graça construído a partir de depoimentos, excertos musicais, fotografias, imagens em movimento e documentos reunidos ao longo da pesquisa — revela-nos com simplicidade e saber toda a riqueza da sua música (1), do seu legado intelectual e da sua personalidade, à luz do presente.
E nem de propósito, a coincidir com a recente consagração mundial do Cante Alentejano, este documentário vem recordar o papel pioneiro de Lopes Graça na música coral portuguesa e na recolha da nossa música tradicional (2), e inclui mesmo um apontamento extra sobre a digressão pelos Estados Unidos, pela mão do compositor, do grupo coral alentejano da Aldeia Nova de São Bento, a convite da Smithsonian Institution, por ocasião do bicentenário do país, em 1976.
Bem vindo às “Músicas Festivas” de Fernando Lopes Graça, disponível em DVD numa loja perto de si.
Notas:
1. “Muita da sua reflexão vem de um trabalho de desconstrução dessas músicas tradicionais e de transposição de elementos que ele encontra nessa linguagem popular para uma esfera erudita em que depois cruza esses elementos com as referências cosmopolitas das vanguardas modernistas em que se integrou”. [Rui Vieira Nery na introdução]
2. Lopes Graça cria nos anos 40 o Coro da Academia de Amadores de Música. As suas harmonizações das Canções Regionais Portuguesas e as Canções Heróicas serão cantadas pelo Coro por todo o país. O interesse de Lopes Graça por este património tradicional e o trabalho que desenvolveu nesta área é comparável ao de Garrett com o Romanceiro, acerca do qual o compositor escreveu na revista Gazeta Musical um artigo que será abordado em futuro post.
*Na web em português aqui e EN-FRA-RU-ESP-HUN
trailer do documentário aqui
facebook aqui
Cristina Futscher Pereira
17 Abril 1948—27 Setembro 2005
Caro Almeida Garrett
Perdoe-me tão directa interpelação, mas creia que não o incomodaria por pouca coisa. Conhece bem o drama de partir, e de partir cedo. De partir cedo demais. Sei, por isso, que entenderá o que tenho para dizer.
O seu nome e a sua obra são ainda venerados nesta sua terra, embora um pouco da mesma forma que os monumentos o costumam ser. Reverenciados, mas na verdade esquecidos, ignorados, e vandalizados. Nada de novo, como muito bem sabe.
Imagine que se descobriram os manuscritos inéditos do seu Romanceiro misturados com outros papéis que estavam em casa de Venâncio Deslandes, na época director da Imprensa Nacional. Podemos talvez imaginar as razões pelas quais o Senhor Deslandes poderá ter levado os manuscritos para casa, mas provavelmente nunca saberemos ao certo a razão de lá terem ficado até a Cristina Futscher Pereira os ter descoberto.
Mas o achado constituiu também um encontro.
A partir desse momento o destino de Cristina Futscher Pereira passou a estar ligado ao destino desses papéis, e Você, meu caro Garrett, passou a estar no centro do seu entusiasmo. Ela pressagiava que aqueles manuscritos eram um sinal da sua boa estrela, e até construiu este pequeno «templo», de onde agora lhe escrevo, para nele partilhar as boas novas com todos os interessados.
Mas (quase) ninguém estava verdadeiramente interessado. Bem, houve alguns lampejos de interesse pelos papéis, noblesse oblige, embora frouxos e breves. Não sei, talvez estejamos cansados de ser um País, de ter uma História tão pesada e de tão incerto saldo.
Além do mais, o romanceiro é uma coisa tão out, tão old fashioned — you know what I mean? —, é coisa de um mundo que já não existe, e que por isso já não nos interessa. Claro, é bom que se preserve, alguém que se encarregue de guardar essas coisas. Pode ser que um dia façam falta, sei lá.
Apesar de tudo, o meu Amigo nem tem muito de que se queixar. Apesar do infortúnio pedagógico das Viagens, ainda faz parte do cânone, ninguém lhe impugna o episódio do Mindelo, ainda lhe dão palco nos teatros, o fraque verde, a gravata de cor e o chapéu branco ainda causam um simulacro de furor entre as senhoras. Da sua poesia sobraram as Folhas Caídas (cujo pathos aumenta se se souber da história com a viscondessa da Luz), e a sua eloquência ainda ecoa vagamente no Parlamento. Outros não se podem gabar de tanto.
Mas na verdade pouca gente o lê e, hélas!, cada vez menos gente fala a mesma língua em que Você escreveu páginas tão marcantes.
Adiante. Eu conheci a Cristina por sua causa. Digamos que foi o ilustre Autor que propiciou o nosso encontro. Assim que lhe ouvi os planos, logo a alertei para esperar muito pouco ou nada. Mas o meu cepticismo foi cedendo à sua energia e vontade de suscitar um interesse renovado pela sua figura e pela sua obra, caro Garrett. E a isso eu não me poderia negar.
O resultado dessa colaboração está aqui nestas páginas escritas no éter (o meu caro Amigo perdoará não me atrever sequer a tentar explicar-lhe o que isto é…), mas está também nas muitas cartas que trocámos, através da quais o nosso relacionamento atingiu a patente de amizade.
Caro Almeida Garrett, a Cristina Futscher Pereira morreu.
Partiu cedo demais, como também aconteceu consigo. Com a morte dela, morre também este espaço que ela lhe dedicou, no qual eu tive a honra e o gosto de participar.
Ele aí – aí?, aqui? – fica, como testemunho de como lhe pulsou o coração ao longo do seu último ano de vida. A Cristina fez o que pôde, até já não poder fazer mais. Mas fica também o exemplo, e, quem sabe?, talvez ele frutifique, talvez possa ser retomado. Não é verdade que todos lhe devemos isso?
Cumprido este dever de que voluntariamente me incumbi, despeço-me com a estima e a admiração de sempre.
Jorge Colaço
Post-Scriptum – Se os mortos e os tempos conviverem e se misturarem como acontece na Torre de Barbela de Ruben A., estou certo de que há-de vir a conhecer a Cristina. Peço-lhe que a trate como a uma boa e dedicada Amiga.
Notas:
Este texto fechou o blog O Divino em 2005. O blog garrettiano fora criado por Cristina em 2004 e foi retirado dos blogs do sapo cinco anos depois.
Jorge Colaço é o autor dos blogs Retentiva e Conteúdos em Português.
Leia também os posts
Garrett liberal, romântico, escritor, homem de espírito, pesquisador, homem de acção...
Venâncio Augusto Deslandes (1829-1909)
Inéditos do romanceiro garrettiano neste blog na tag Garrett
Lettre à Garrett (2005)
Cher Almeida Garrett,
Pardonnez-moi de vous interpeller ainsi, si soudainement, mais, croyez bien que je n’oserais pas vous importuner pour un rien. Partir, et partir tôt, est un drame que vous connaissez bien. Partir trop tôt. Je sais, donc, que vous comprendrez ce que j’ai à vous dire.
Votre nom et votre œuvre sont encore vénérés dans ce pays qui est le vôtre, même si on leur voue, en somme, l’estime accordée habituellement aux monuments. Révérés, mais en vérité, oubliés, ignorés et vandalisés. Rien de nouveau, nous le savons bien.
Imaginez-vous que les manuscrits inédits de votre Romanceiro ont été découverts dans un tas de papiers qui se trouvait chez Venâncio Deslandes, jadis directeur de l’Imprensa Nacional. Il n’est pas difficile d’imaginer les raisons qui auront conduit Monsieur Deslandes à rapporter le manuscrit chez lui mais nous ne saurons probablement jamais le fin mot de l’histoire qui explique qu’ils y soient restés jusqu’à ce que Cristina Futscher Pereira ne les déniche.
Mais cette découverte fut aussi une rencontre.
Car, dès cet instant, le destin de Cristina Futscher Pereira s’est mêlé à celui de ces documents. Et vous, mon cher Garrett, sachez que vous avez nourri son enthousiasme. Elle pressentait que ces manuscrits étaient une manifestation de sa bonne étoile et alla même jusqu’à construire ce petit temple d’où je vous écris, pour y partager les bonnes nouvelles avec tous ceux qu’elles intéresseraient.
Mais, (presque) personne ne se montra intéressé. Enfin, il y eu quelques lueurs d’intérêt pour ces documents, noblesse oblige , bien qu’elles fussent mornes et brèves. Qui sait, peut-être sommes-nous fatigués d’être un Pays, d’avoir une Histoire si pesante, au bilan si incertain.
Et puis, un Romanceiro, n’est-ce pas quelque chose de complètement has been, si old fashioned – you know what I mean? – quelque chose qui appartient à un monde qui n’est plus et qui a donc cessé de nous intéresser ? Bien sûr, il convient de le protéger et quelqu’un doit se charger de conserver ces choses. Ça pourrait venir à manquer, un jour, qui sait ?
Et pourtant, cher ami, vous avez bien peu de raisons de vous plaindre. En dépit de l’infortune pédagogique de Voyages , vous faites encore partie du canon, personne ne vous réfute l’épisode de Mindelo, la scène des théâtres vous est encore ouverte, le frac vert, la cravate colorée et le chapeau blanc provoquent encore bien des émois chez la gente féminine. De votre poésie, il reste Folhas Caídas (dont le pathos augmente quand on connaît l’histoire de la vicomtesse de Luz) et votre éloquence résonne encore vaguement au parlement. Tout le monde n’a pas la chance de pouvoir en dire autant.
Mais en réalité, votre œuvre est bien peu lue et, hélas ! , rares sont ceux qui parlent encore cette langue dans laquelle vous avez écrit ces pages si remarquables.
Poursuivons. J’ai connu Cristina à cause de vous. Disons que c’est l’écrivain illustre qui est à l’origine de notre rencontre. A peine m’avait-elle fait part de ses projets que je lui disais de ne rien attendre, ou si peu. Mais mon scepticisme a cédé face à l’énergie qui l’animait et à son désir d’éveiller un intérêt renouvelé pour votre personne, cher Garrett, et pour votre œuvre. Comment aurais-je pu refuser ?
Le résultat de cette collaboration est là, dans ces pages écrites dans l’éther (vous me pardonnerez, cher ami, de ne pas me risquer à la moindre explication...) mais aussi, dans ce riche échange épistolaire d’où est née une amitié certaine.
Cher Almeida Garrett, Cristina Futscher Pereira n’est plus.
Elle est partie trop tôt, comme vous. Avec elle, disparaît également cet espace qu’elle vous avait consacré et auquel j’ai eu l’honneur et le plaisir de participer.
Et lui là, – là ? Ici ? – reste pour témoigner de ces battements de cœur que vous avez provoqués tout au long de sa dernière année de vie. Cristina a fait ce qu’elle a pu jusqu’à ne plus pouvoir. Mais son exemple est là et, qui sait, peut-être fera-t-il des émules, peut-être sera-t-il repris ? N’est-il pas vrai que nous lui sommes tous redevables ?
C’est le devoir accompli - dont je me suis moi-même investi - que je vous salue, toujours plein d’estime et d’admiration.
Jorge Colaço
Post-Scriptum – Si les morts et les époques se rejoignent et se mêlent comme dans La Tour de Barbela de Ruben A., vous finirez par faire la connaissance de Cristina. Je vous demande de lui accorder le traitement que l’on réserve aux amis sincères et dévoués.
Traduction de Laurence Corréard
Lettre à Garrett fut le dernier texte publié dans O Divino , un blog créé par Cristina en 2004.
Anonyme; Cabinet de curiosités; (fin XVIIe siècle)
Huile sur toile; Florence; Opificio delle Pietre Dure. aqui
Tenho celebrado um ou outro aniversário do blog com um breve balanço e queria tê-lo feito neste quinto aniversário, mas atrasei-me. Quero antes de mais agradecer os comentários deixados no post de 15 de Novembro. As palavras de incentivo de tão ilustres colegas da blogosfera animam-me particularmente. Assinalei a data com um cartoon que divide a blogosfera entre “histórias sobre ninharias que alguém cozinhou, tricotou ou coseu”, “auto-promoção” e “teorias da conspiração”. Está bem visto, em versão mais soft seria o facebook, os blogs pessoais e os blogs políticos.
Em poucas palavras, para quem me visita pela primeira vez, este blog divide-se entre histórias do meu álbum de família (fotos, recordações e curiosidades do espólio familiar), histórias dos álbuns dos outros (fotografias e curiosidades dos espólios de outras famílias) e, last but not least, textos bastante variados de Autores, sobretudo excertos de obras de história, jornalismo, ensaio e alguma literatura.
Os textos que eu própria escrevo (em minoria) tratam normalmente de espólios familiares, álbuns e recordações, enquanto as citações de Autor e os textos doutras pessoas surgem geralmente a propósito da actualidade e/ou do calendário. Quanto às imagens tenho procurado apresentar um máximo de material inédito, inicialmente com base no meu arquivo familiar e, progressivamente, a partir de colecções particulares que parentes e amigos têm posto generosamente à minha disposição.
O blog recebe actualmente em média 50 visitas por dia e poucos comentários (cerca de 300 até hoje em 480 posts). O propósito continua a ser o mesmo: partilhar a minha exploração da fotografia vernacular e reflexões de Autores favoritos, além de contribuir, mesmo que modestamente, para o universo dos conteúdos em português, com imagens, perfis e textos algo esquecidos*.
Queridos Leitores e visitantes em geral, continuarei a esforçar-me por merecer a vossa visita.
* Notas:
Cabinet de curiosités 1 in English
Neste contexto veja o blog Restos de Colecção aqui e o projecto Conteúdos em Português aqui
Neste blog, um texto sobre a Fotografia Vernacular aqui , um perfil aqui e um texto de Autor ilustrado com uma foto aqui
Audições no fim do ano lectivo na Academia de Amadores de Música*, Lisboa, Junho 1969.
Miguel Azevedo e Sílvia Camilo. Flauta de bisel. Professora: Catarina Latino
São 23 obras para piano, compostas ao longo de três décadas por Fernando Lopes Graça para aniversários, bodas e outros acontecimentos como a inauguração de uma casa ou um simples convívio de amigos.
"Umas são pequenas, outras maiorzinhas. É uma colecção que eu tenho: uma comemoração disto, uma comemoração daquilo, uns anos deste, um casamento daquele... São "Músicas Festivas" (F.L.G. fev. 1986).
Em 1962, ano em que inicia a composição das Músicas Festivas, Fernando Lopes-Graça muda-se de Lisboa, onde ainda compõe a primeira peça deste ciclo, para um apartamento na Parede. Aí, um pequeno gabinete com um piano vertical passará a ser a oficina do compositor até à sua morte. Após uma fase emocionalmente dilacerante que culminará nessa obra-prima que é Canto de Amor e de Morte (1961), este ciclo de Músicas Festivas parece inaugurar, simbolicamente, uma nova fase na vida do compositor. (1)
partitura original
A colecção inédita — das 23 peças 13 nunca foram tocadas em público e 18 nunca foram gravadas — será registada em múltiplos suportes para permitir a criação de conteúdo não efémero. A iniciativa partiu de um grupo de amigos de que hoje fazem parte três dos dedicatários das Músicas Festivas, entre outros colaboradores, e todas as acções vão por diante apesar de os apoios terem sido muito escassos.
Um Concerto no Centro Cultural de Belém a 16 de Dezembro de 2012 incluirá a maior parte das peças, interpretadas pelo pianista António Rosado e com uma introdução do musicólogo Rui Vieira Nery . Na mesma data serão lançados os quatro volumes das partituras (em papel) e o primeiro volume do CD das Músicas Festivas [2]. Os autores do projecto criaram igualmente um sítio web [3] e um álbum de fotografias digital [4]. Mais tarde será produzido um DVD incluindo o concerto ao vivo e um documentário, com depoimentos dos dedicatários e outras pessoas próximas do compositor.
Além do seu interesse cultural manifesto, esta edição multimédia das Músicas Festivas de Fernando Lopes Graça é sem dúvida um modelo inspirador de "Álbum de Família" ou, melhor dizendo neste caso, de "Livro dos Amigos".
Fernando Lopes Graça (1906-1994)
retratado por Cecília Pinto
Notas:
1 Texto integral de João Espírito Santo (Outubro de 2012) aqui
2 CD: integral Músicas Festivas pelo pianista António Rosado
3 sítio web aqui
4 álbuns de fotografias aqui
5 um perfil de Fernando Lopes-Graça aqui
6 De todos os materiais produzidos serão entregues exemplares ao Museu da Música Portuguesa - Casa Verdades de Faria para serem integrados no espólio do compositor. aqui
7 Imagens deste post encontradas aqui
8 Fernando Lopes-Graça e a Academia de Amadores de Música aqui
As Fontes do Romanceiro de Almeida Garrett. Uma Proposta de ‘Edição Crítica’, tese de doutoramento que Sandra Cristina Boto defendeu ontem na Universidade Nova de Lisboa, representa para a minha família a conclusão feliz dum percurso iniciado em 2004 pela descoberta duma importante colecção de autógrafos garrettianos em nossa casa. Ao apresentar com esta colecção perspectivas inteiramente novas sobre o romanceiro garrettiano, o trabalho de Sandra Boto confere pleno sentido ao enorme esforço que minha irmã dedicou à divulgação deste espólio, em grande parte inédito.
Hoje penso que foi sorte estes papéis serem redescobertos por uma estrangeirada, que nunca tinha lido as Viagens na Minha Terra, mas de Garrett sabia pelo menos que “main street is named after him!” (Cristina Futscher Pereira dixit). Quantos portugueses de gema se teriam dado ao trabalho?
Diz Sandra Boto na introdução:
Sabia-se, por fontes externas, que a colecção continha novos temas tradicionais. A publicação, na edição de 9 de Dezembro de 2004 do jornal Público, de um tema religioso de base tradicional, Fonte da Cruz, fazia suspeitar da importância destes materiais para o estudo do romanceiro tradicional garrettiano. Sabia-se também que entre estes autógrafos se encontrariam igualmente temas de origem não tradicional. Aliás, um romance criado pela pena garrettiana, A moira encantada, constituíra, a 29 de Dezembro de 2004, o verdadeiro cartão de visita desta colecção, num infelizmente pouco valorizado suplemento do Diário de Notícias. (1)
A Moira Encantada de João Baptista de Almeida Garrett
ISSN 0870-1954 Lisboa, Dezembro 2004
Do ponto de vista da minha família, a edição de A Moira Encantada foi um pequeno milagre, só tornado possível por circunstâncias muito favoráveis como o apoio essencial que recebemos de Ofélia Paiva Monteiro e Maria Helena Santana, e o facto de termos encontrado patrocinadores - Diário de Notícias e Portugal Telecom - que gostaram do projecto e nos deram autonomia total para o realizar.
Uns meses depois, as duas especialistas chamavam a atenção para a riqueza do espólio agora encontrado, concluindo que dar a conhecer este romanceiro inédito seria prosseguir a tarefa que o próprio Garrett definiu como um “grande serviço ao seu País” [2]. Mas (quase) ninguém estava interessado, como sintetizou mais tarde Jorge Colaço [3] ao contar a história na sua Carta a Garrett.
No entanto, sete anos volvidos sobre a descoberta da 'Colecção Futscher Pereira' [4], a Proposta de ‘Edição Crítica’ de Sandra Boto vem contrariar o pessimismo e convidar-nos a revisitar o nosso Autor e o seu apaixonante Romanceiro:
[...] no que concerne ao Romanceiro, a elaboração de um plano editorial patente na “Introducção” ao tomo II da obra, cujos preparativos e rascunhos textuais se prova estarem documentalmente contidos na Colecção Futscher Pereira em autógrafos garrettianos, só nos anima a levar a cabo a tarefa de prosseguir editorialmente com esse mesmo plano, que a morte do poeta impediu de se cumprir. A não destruição intencional destes materiais em vida de Garrett conjugada com o manifesto de intenções que é o mencionado plano editorial, o qual por seu turno entendemos como uma vontade expressa autoral de vir a publicar futuramente esses materiais, é garante de que é uma missão estudá-los e editá-los, mesmo com mais de 150 anos de atraso.[1]
Autógrafo de Almeida Garrett:
Romanceiro
Colecções de xácaras, estudos e apontamentos para a confecção do Romanceiro
Manuscrito do Autor
Notas:
1 Sandra Cristina Boto in As Fontes do Romanceiro de Almeida Garrett. Uma Proposta de 'Edição Crítica' (introdução)
Tese de Doutoramento em Línguas, Literaturas e Culturas, Especialidade de Estudos Literários
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, 2011
2 Ofélia Paiva Monteiro e Maria Helena Santana in No aniversário da morte de Garrett. Apresentação de um inédito do Romanceiro. Annualia Verbo. Temas, Factos, Figuras, 2005/2006. pp.235-239
3 o blog de Jorge Colaço aqui
4 Colecção Futscher Pereira (CFP), assim designada por Sandra Boto. São também as iniciais de Cristina Futscher Pereira, coincidência feliz.
O blog garrettiano de Cristina Futscher Pereira -— O Divino — deixou de estar acessível no blogs.sapo.pt
Texto integral de A Moira Encantada aqui
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