No largo do Carmo, estava a força de Santarém e estava sobretudo Salgueiro Maia. Nas longas horas que com ele ali vivi e confraternizei, pude apreciar a tranquila audácia dum homem que, com duas autometralhadoras e centena e meia de recrutas, estava a destruir cinquenta anos de história, de farroncas de força e de poder, mantendo em respeito uma força profissional e adestrada como era a Guarda Nacional Republicana. Salgueiro Maia estava cercado; pelo Rossio quase até ao alto da Calçada do Carmo, pela Rua da Trindade e Largo da Misericórdia, onde se encontravam entrincheiradas as forças da GNR. No Chiado, até aos largos, os blindados hostis da Cavalaria 7, e julgo recordar que também da Cavalaria 2 e Metralhadoras 1. Mas nem sequer um sentimento de dúvida ou de incerteza pairou na praça. Levada pelo sopro da liberdade, a multidão acorria e o quadro do povo expressava ali a vontade da nação contra qualquer veleidade de repressão sangrenta.
artigo do jornal “Público” 27/04/91 aqui