Se a capacidade da fotografia em capturar o extraordinário ou o contingente causou, em termos históricos, maravilha, pelo seu aparente condão de magicamente embalsamar o tempo, a mesma provocou simultaneamente um certo desconforto, já que a preservação de um momento fugidio também servia paradoxalmente de lembrete da corrupção de tudo aquilo que é próprio ao tempo. No arquivo, vemos escrito a letras gordas aquilo que a fotografia leva a cabo numa escala mais modesta: um diálogo com a posteridade, um endereçamento a um tempo por vir, um tempo em que esse mesmo artefacto será ancião, um souvenir de um passado irrecuperável. O objeto arquivístico, tal qual a fotografia, é uma despojada lembrança da morte no futuro.
Com a proliferação da fotografia doméstica (muitos artistas contemporâneos simulam a aparência inábil e inexpressiva das fotos instantâneas) e o interesse crescente pela história e antropologia da vida quotidiana, o arquivo familiar veio juntar-se a outros lugares arquivísticos históricos e burocráticos, tornando-se ao mesmo tempo fonte de significado etnográfico e um lugar menor e localizado (ou até mesmo virtual) de memorialização privada. Em suma, o arquivo tem-se tornado tão ubíquo e comum como a própria fotografia.
Ruth Rosengarten
in folha da exposição Entre Memória e Arquivo
In English: Between Memory and Archive here
Vivan Sundaram, Lovers, 2001
Colecção Berardo, cortesia do artista
Entre Memória e Arquivo
Helena Almeida, Bernd e Hilla Becher, Daniel Blaufuks, Christian Boltanski, Marcel Duchamp, Allan McCollum, Chantal Joffe, Tracy Moffatt, José Luís Neto, Gabriel Orozco, Pedro Quintas, Umrao Singh Sher-Gil, Augusto Alves da Silva, Hiroshi Sugimoto, Vivan Sundaram, Jemima Stehli, Wolf Vostell, Robert Wilson, Francesca Woodman. Curadoria de Ruth Rosengarten*
até 29 de Setembro de 2013
Museu Colecção Berardo
*o blog Tempus Fugit de Ruth Rosengarten aqui e na lista de blogs deste blog
Le ciel ne voyage pas, mais les pensées parcourent des distances incroyables. Riches en vaticinatons, elles se servent des visions ailées qui ne se posent que de rares fois.
Il arrive qu'elles stagnent dans les cerveaux humains. Quand elles s'élaborent dans la matière grise, l'enceinte où elles gravitent se dessèche et les empêche de se projeter dans le rêve. Alors les pensées ne libèrent pas leurs facultés créatrices; elles restent inanimées et privées de magie. En revanche, le vol que produit le rêve ne sait pas ce que veut dire la mort.
Silvia Baron Supervielle
in Lettres à des photographies (Lettre 74)
© Éditions Gallimard, 2013
Vidal e Hugo Navarro de Andrade Belmarço (c. 1900)
outra foto dos irmãos aqui
interessante apontamento sobre Vidal Belmarço no blog Promontório da Memória aqui
Casa Belmarço aqui
Manuel de Jesus Belmarço c. 1890
O jornal Público noticiou há dias que a Casa Belmarço em Faro, adquirida em tempos pela Câmara da cidade para ali instalar o Tribunal da Relação, foi posta à venda pelo Estado. A casa foi mandada construir por meu bisavô sob projecto do arquitecto Norte Júnior e inaugurada em 1912.
Manuel de Jesus Belmarço (1857-1918) fez fortuna no Brasil como negociante de cereais e café. Casou com Maria Luísa Navarro de Andrade e tiveram quatro filhos, três dos quais nasceram no Brasil. Viveu com a família em S. Paulo e após regressar a Portugal, em 1899, construiu uma casa em Lisboa, na Avenida da Liberdade, e esta em Faro, a cidade onde nascera. O filho mais velho, Vidal Alberto Belmarço (1891-1961) e a mulher, Amélia Salter de Sousa Belmarço (1886-1964) viveram nesta casa até ao fim da vida.
a notícia recente aqui
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a Casa Belmarço na Wikipedia aqui
Arquitecto Manuel Josquim Norte Júnior aqui
Trapiche Belmarço e sua ponte de madeira, na cidade de Santos aqui
© Museu do Porto de Santos - Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp)
Fotos antigas do Porto de Santos na Fundação Arquivo e Memória de Santos aqui